Chegamos em casa cansados do trabalho, em busca de um bom
banho, nos alimentar, um afago nas
crianças, ver uma televisãozinha e descansar, para suar no dia seguinte, o pão
nosso de cada dia.
Sentamos na cama ou sofá, esperamos o jornal das oito, que
começa as nove, e nos indignamos a ponto de querer desligar a televisão. Mas a
indignação é grande. O sangue até da uma esquentadinha e você murmura entre os
dentes: “canalhas, cadeia para todos”. Acaba o jornal e você pode até tentar
uma saliência para espairecer, com seu parceiro ou parceira. Se conseguir,
melhor. Senão, é mais revolta ao ler nos jornais do dia seguinte as manchetes
assistidas na noite anterior. “Bandidos” você pensa, ”na próxima eleição vão
ver só”, continua pensando, até começar o batente.
O fluxo acima pode ser muito bem o seu, que nos escuta
agora. Não adivinhamos. Este fluxo pode representar a maioria das pessoas que
possuem algum “status”, algum dinheiro e são consideradas como Classe Média,
Média Alta. Acham que o dia é curto, se matam no trabalho para, no final do
mês, por compensação e não por dever cumprido, receberem um “dimdim” e continuar
vendo e ouvindo, sem discutir o que os donos das mídias nos impõem.
Vamos apresentar em dois momentos distintos, com
aproximadamente vinte anos de diferença, dois episódios, um político e outro
policial, que demonstram bem a que pode levar a nossa “preguiça” de ler uma
notícia inteira e, principalmente não busca-la em outras fontes de informação
(outra mídia de viés político e/ou econômico distinto daquela que vemos todos
os dias). Simplificando, transformar uma informação em conhecimento.
Em ordem decrescente de data, começaremos com a questão
política bem atual. Vamos começar pela AP 470, conhecida como mensalão. Vamos
citar a condenação do João Paulo Cunha e do Pizzolatto. Em seguida falaremos do
episódio da Escola de Base, da cidade de São Paulo, evento ocorrido no ano de
1994.
Mensalão
Pizzolato foi condenado por ter facilitado o desvio de quase
R$ 74 milhões considerados dinheiro público pelo STF e João Paulo de R$ X,x
milhões.
Vamos ao Pizollatto:
·
Barbosa encaminha aos demais Ministros o Auto
2828, do Instituto Nacional de Criminalística, que investigou no Banco do
Brasil, quem era responsável pela movimentação do dinheiro do Visanet (hoje
Cielo), com “bilhetinho” dizendo tratar-se de um documento longo (43 páginas) e
ele já havia lido e estava convencido da culpa do Pizolatto – Não sabemos quem
mais leu o documento mas, o nome Pizolatto não é citado em nenhuma das páginas
do documento;
·
Foram necessárias 767 NFs (mãe) e 2631 NFs
(filhas) assinadas por um total de 57 funcionários do BB diferentes;
·
Todas as 767 NFs e suas filhas foram auditadas
pela Simonaggio Perícias, empresa de auditoria muito utilizada nos tribunais
nacionais;
·
Nenhumas destas NFs têm validade, sem que haja,
no mínimo, três assinaturas atestando a transferência;
·
Somando-se o total de assinaturas por NF,
chegamos ao total de 2631 assinaturas,
·
Nomes como o de Rogério Oliveira (PSDBXXXX)
aparecem 541 vezes; Cláudio Vasconcelos 386, Roberto Messias em 279 NFs;
Rosemere Souza em 229 e Pizolatto em 19 NFs, é o 20º colocado da lista.
Assinaram mais NFs que ele, 19 outros funcionários do BB;
Somente Pizolatto foi acusado e
condenado apesar dos inquéritos da Polícia Federal chegarem a conclusão que não
houve mensalão (mais de 300 depoimentos). O dinheiro do Visanet nunca foi
público e não houve formação de quadrilha. O delegado Zapronha foi punido por
dizer em uma entrevista que a acusação de formação de quadrilha era motivo de
piada dentro da Polícia Federal.
Alguém viu algumas destas
informações estampadas na mídia escrita ou nas chamadas dos telejornais? Elas
existem e constam dos Autos da AP 470, com número de folha e outros detalhes.
Deve ter sido por conta disso, de
fazerem parte do processo, que o procurador Souza, que antecedeu Gurgel, ter
pedido para o Barbosa não incluir na Ap 470 os laudos periciais enviados pelo
delegado Zapronha. “Poderia confundir o público”, escreveu ele em mais um
bilhetinho.
Agora como ficaria você, ao
chegar em casa, depois de suar o pão do dia e ter acesso a discussão acima,
ouvir os dois lados da contenta? Eu ficaria satisfeito pois poderia tirar as
minhas conclusões a partir das informações disponibilizadas. O problema é que
só temos um lado da moeda disponível. Isto é correto? É este o papel da mídia?
Disponibilizar só o que lhes interessa?
Já no caso do João Paulo Cunha a
situação é mais deprimente ainda. Todos conhecem o João Paulo. Para o padrão dos deputados em Brasília é conhecido
como o “pobretão” da turma. A exemplo de Genoíno, ainda mora no mesmo bairro
operário, e sua modesta casa não pagaria a multa imposta no STF.
Barbosa condenou Cunha baseado em
três situações:
1. Relatório
da Secretaria de Controle Interno – SECIN da Câmara comprova que houve desvio
de verba para a SMP&B. Relatório feito preliminarmente por Alexis Souza,
funcionário do Severino Cavalcanti (adversário político de Cunha) que seria
nomeado para a SECIN;
2. Relatório
da Secretaria de Controle Externo do Tribunal de Contas da União comprovou a
existência de desvio por parte de João Paulo;
3. Peritos
do instituto Nacional de Criminalística da PF foram unânimes em apontar o
desvio.
Por conta destes pontos, Cunha
foi incluído no processo da AP 470.
Agora vejamos o que apontam os
relatórios que basearam Barbosa e seus pares a condenarem Cunha:
1. Alexis
Souza nunca tomou posse na SECIN por conta da renúncia do Severino Cavalcanti,
fugindo da cassação. Aldo Rabelo assume a presidência da Câmara e a pedido de
João Paulo, inicia uma auditoria. Esta auditoria passa por oito comissões de
sindicância da Câmara e, em fevereiro de 2010, chega à conclusão de que não
existia qualquer indício de desvio de verba. Porém, Barbosa já havia incluído
João Paulo na AP 470, antes da conclusão da citada auditoria;
2. Uma
turma de inspeção de uma das secretarias de Controle Externo do TCU visitou a
Câmara entre 25/07 e 3/08 e trabalhou em cima do relatório de Alexis, mesmo ele
não tendo nenhum valor legal. A 3ª Secretaria de Controle Externo do TCU recebe
o relatório para análise e conclui em 2008, quando o acórdão do pleno foi
publicado, considerando o contrato regular e sem indícios de desvio de verba;
3. Este
é o ponto mais escabroso. Souza, procurador que antecedeu Gurgel, envia ofício
à Barbosa pedindo que os Autos periciais enviados pelo delegado da PF Zapronha
não fossem incluídos na AP 470, pois poderiam causar confusão ao público. Na
realidade, Zapronha participou da investigação desde a CPI do Correio até o fim
do mensalão. Foi ele quem pediu todas as perícias ao INC e, todas as perícias
apontaram para a NÃO formação de quadrilha, para a inexistência de desvio de
dinheiro público, inocentava Dirceu, João Paulo e Genoíno e atestava como
verdadeiro o empréstimo realizado pelo PT junto aos bancos Rural e BMG. Ou
seja, toda a tese usada para a confirmação de existência do mensalão e para a
formação de quadrilha e a consequente condenação dos “réus” são falsas.
Agora respondam, lá fundo de suas
consciências, se ao longo de 2002, quando Jeferson inventa o termo mensalão
(nos depoimentos na PF ele falava que era caixa 2) até os dias de hoje, 2013
alguém ouviu ouviu alguma manchete ou canto de página com o exposto acima?
Alguém já se perguntou o porquê das Organizações Globo não questionarem ou
negarem os valores recebidos por eles através da SMP&B? Porque a Visanet,
hoje Cielo, nunca abriu processo para reaver o dinheiro desviado de suas
contas?
Agora retornemos ao ano de 1994 e
vamos ao caso da Escola Base
Um grupo de mães procura a
polícia e denuncia que os donos e funcionários da Escola de Base drogavam as
crianças e depois abusavam sexualmente delas. Delegado responsável ouve as
denúncias e antes mesmo de investigar, chama a mídia e solta a bomba. A mídia,
por sua vez, a exemplo do delegado, não ouve ninguém e solta as manchetes
bombásticas:
·
Kombi era motel na escolinha do sexo;
·
Perua escolar levava crianças para orgia.
Donos da escola e alguns
funcionários são presos, seus rostos estampados nacionalmente e suas casas e a
escola são depredadas pela população indignada enquanto encontravam-se presos.
Passado o tempo, chega-se a
conclusão de que não foi nada daquilo. O laudo do IML , não conclusivo diz que
pode ter havido ato sexual com o menino examinado ou, pode ser por diarreia
aguda as fissuras encontradas. Aí, a mãe do menino lembra que ele tinha tido
uma diarreia forte na época.
Rede Globo é condenada a pagar R$
1,35 milhões de indenização aos envolvidos. Grupo Folha, o Estadão e a Isto É,
também foram condenados e todos recorreram ao STF que até hoje, quase vinte
anos depois, ainda não julgaram o caso.
Agora imagine você passando por
uma situação dessas? Casa destruída, emprego no lixo e todos virando a cara
para você. Mas digamos que você tenha sorte e seja inocentado como foram os
“réus” da Escola Base. Porque, até hoje não recebeu nada e porque até hoje a
mídia se omite? É justo? Ou isso só acontece com o vizinho e nunca acontecerá
com você?
Dois episódios diferentes que
demonstram o mesmo comportamento covarde. Um político, não interessa os fatos,
interessa somente o que lhes proporcionará atingir o fim pretendido, seus
objetivos políticos. No outro, a falta de notícias que motivassem manchetes
rentáveis, o dinheiro pelo dinheiro e somente por ele. Por conta da ganância
por mais lucro, nada é medido, vale tudo.
Na questão política, vemos a
mesma prática desde os anos cinquenta, quando Getúlio comete suicídio para
impedir o Golpe, o que era incentivado pelos mesmos jornais e posteriormente
pela televisão de hoje. Repetiram a dose em 64, na campanha das Diretas Já, na
eleição do Collor, FHC e o desmantelamento do estado e, hoje, com o
mensalão. Diferente, somente o que
aprenderam após o processo da Escola de Base. Hoje, todas as manchetes e
chamadas televisivas iniciam com os termos, “supostamente”, “possivelmente” e
outros “mentes”, pois sempre mentem ou manipulam a informação.
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