Os Dez Mandamentos
Ladislau Dowbor
Como sociedade, desejamos não somente
sobreviver, mas viver com qualidade de vida, e porque não, com felicidade. E
isto implica elencarmos de forma ordenada os resultados mínimos a serem
atingidos, com os processos decisórios correspondentes. Os Mandamentos abaixo
elencados têm um denominador comum: todos já foram experimentados e estão sendo
aplicados em diversas regiões do mundo, setores ou instâncias de atividade. São
iniciativas que deram certo, e cuja generalização, com as devidas adaptações e
flexibilidade em função da diversidade planetária, é hoje viável. Não temos a ilusão
relativamente à distância entre a realidade política de hoje e as medidas
sistematizadas abaixo. Mas pareceu-nos essencial, de toda forma, elencar de
forma organizada as medidas necessárias, pois ter um norte mais claro ajuda na
construção de uma outra governança planetária. Não estão ordenadas por ordem de importância, pois a maioria tem
implicações simultâneas e dimensões interativas. Mas todos os mandamentos deverão
ser obedecidos, pois a ira dos elementos nos atingirá a todos, sem precisar
esperar a outra vida.
Considerando que a obediência à
versão original dos Dez Mandamentos foi apenas aleatória, desta vez o Autor
teve a prudência de acrescentar a cada Mandamento uma nota de explicação,
destinada em particular aos impenitentes.
I – Não comprarás os
Representantes do Povo
Resgatar a dimensão pública do Estado: Como podemos ter mecanismos
reguladores que funcionem se é o dinheiro das corporações a regular que elege
os reguladores? Se as agências que avaliam risco são pagas por quem cria o
risco? Se é aceitável que os responsáveis de um banco central venham das
empresas que precisam ser reguladas, e voltem para nelas encontrar emprego?
Uma das propostas mais evidentes
da última crise financeira, e que encontramos mencionada em quase todo o
espectro político, é a necessidade de se reduzir a capacidade das corporações
privadas ditarem as regras do jogo. A quantidade de leis aprovadas no sentido
de reduzir impostos sobre transações financeiras, de reduzir a regulação de
banco central, de autorizar os bancos a fazerem toda e qualquer operação,
somado com o poder dos lobbies financeiros tornam evidente a necessidade de se resgatar
o poder regulador do estado, e para isto os políticos devem ser eleitos por
pessoas de verdade, e não por pessoas jurídicas, que constituem ficções em
termos de direitos humanos. Enquanto não tivermos financiamento público das
campanhas, políticas que representem os interesses dos cidadãos, prevalecerão
os interesses econômicos de curto prazo, os desastres ambientais e a corrupção.
II – Não Farás
Contas erradas
As
contas têm de refletir os objetivos que visamos. O PIB indica a intensidade
do uso do aparelho produtivo, mas não nos indica a utilidade do que se produz,
para quem, e com que custos para o estoque de bens naturais de que o planeta
dispõe. Conta como aumento do PIB um desastre ambiental, o aumento de doenças,
o cerceamento de acesso a bens livres. O IDH já foi um imenso avanço, mas temos
de evoluir para uma contabilidade integrada dos resultados efetivos dos nossos
esforços, e particularmente da alocação de recursos financeiros, em função de
um desenvolvimento que não seja apenas economicamente viável, mas também
socialmente justo e ambientalmente sustentável. As metodologias existem,
aplicadas parcialmente em diversos países, setores ou pesquisas. A ampliação
dos indicadores internacionais como o IDH, a generalização de indicadores
nacionais como os Calvert-Henderson Quality of Life Indicators nos Estados
Unidos, as propostas da Comissão Stiglitz/Sen/Fitoussi, o movimento FIB –
Felicidade Interna Bruta – todos apontam para uma reformulação das contas. A
adoção em todas as cidades de indicadores locais de qualidade de vida – veja-se
os Jacksonville Quality of Life Progress Indicators – tornou-se hoje
indispensável para que seja medido o que efetivamente interessa: o
desenvolvimento sustentável, o resultado em termos de qualidade de vida da população.
Muito mais do que o produto (output), trata-se
de medir o resultado (outcome).
III – Não Reduzirás o Próximo à
Miséria
Algumas
coisas não podem faltar a ninguém. A pobreza crítica é o drama maior, tanto
pelo sofrimento que causa em si, como pela articulação com os dramas
ambientais, o não acesso ao conhecimento, a deformação do perfil de produção
que se desinteressa das necessidades dos que não têm capacidade aquisitiva. A
ONU calcula que custaria 300 bilhões de dólares (no valor do ano 2000) tirar da
miséria um bilhão de pessoas que vivem com menos de um dólar por dia. São
custos ridículos quando se considera os trilhões transferidos para grupos
econômicos financeiros no quadro da última crise financeira. O benefício ético
é imenso, pois é inaceitável morrerem de causas ridículas 10 milhões de
crianças por ano. O benefício de curto e médio prazo é grande, na medida em que
os recursos direcionados à base da pirâmide dinamizam imediatamente a micro e
pequena produção, agindo como processo anticíclico, como se tem constatado nas
políticas sociais de muitos países. No mais longo prazo, será uma geração de
crianças que terão sido alimentadas decentemente, o que se transforma em melhor
aproveitamento escolar e maior produtividade na vida adulta. Em termos de
estabilidade política e de segurança geral, os impactos são óbvios. Trata-se do
dinheiro mais bem investido que se possa imaginar, e as experiências
brasileira, mexicana e de outros países já nos forneceram todo o know-how
correspondente. A teoria tão popular de que o pobre se acomoda se receber
ajuda, é simplesmente desmentida pelos fatos: sair da miséria estimula, e o
dinheiro é simplesmente mais útil onde é mais necessário.
IV – Não Privarás Ninguém do Direito de
Ganhar o seu Pão
Universalizar a garantia do emprego é viável. Toda pessoa que
queira ganhar o pão da sua família deve poder ter acesso ao trabalho. Num
planeta onde há um mundo de coisas a fazer, inclusive para resgatar o meio
ambiente, é absurdo o número de pessoas sem acesso a formas organizadas de
produzir e gerar renda. Temos os recursos e os conhecimentos técnicos e
organizacionais para assegurar, em cada vila ou cidade, acesso a um trabalho
decente e socialmente útil. As experiências de Maharashtra na Índia
demonstraram a sua viabilidade, como o mostram as numerosas experiências
brasileiras, sem falar no New Deal da crise dos anos 1930. São opções onde
todos ganham: o município melhora o saneamento básico, a moradia, a manutenção
urbana, a policultura alimentar. As famílias passam a poder viver decentemente,
e a sociedade passa a ser melhor estruturada e menos tensionada. Os gastos com
seguro-desemprego se reduzem. No caso indiano, cada vila ou cidade é obrigada a
ter um cadastro de iniciativas intensivas em mão de obra. Dinheiro emprestado
ou criado desta forma representa investimento, melhoria de qualidade de vida, e
dá excelente retorno. E argumento fundamental: assegura que todos tenham o seu
lugar para participar na construção de um desenvolvimento sustentável. Na
organização econômica, além do resultado produtivo, é essencial pensar no
processo estruturador ou desestruturador gerado. A pesca oceânica industrial
pode ser mais produtiva em volume de peixe, mas o processo é desastroso, tanto
para a vida no mar como para centenas de milhões de pessoas que viviam da pesca
tradicional. A dimensão de geração de emprego de todas as iniciativas
econômicas tem de se tornar central. Assegurar a contribuição produtiva de
todos, ao mesmo tempo que se augmenta gradualmente o salário mínimo e se reduz
a jornada, leva simplesmente a uma prosperidade mais democrática.
V – Não Trabalharás Mais de Quarenta
Horas
Podemos trabalhar menos, e trabalharemos todos, com tempo para fazermos
mais coisas interessantes na vida. A sub-utilização da força de trabalho é
um problema planetário, ainda que desigual na sua gravidade. No Brasil,
conforme vimos, com 100 milhões de pessoas na PEA, temos 31 milhões formalmente
empregadas no setor privado, e 9 milhões de empregados públicos. A conta não fecha.
O setor informal situa-se na ordem de 50% da PEA. Uma imensa parte da nação “se
vira” para sobreviver. No lado dos empregos de ponta, as pessoas não vivem por
excesso de carga de trabalho. Não se trata aqui de uma exigência de luxo: são
incontáveis os suicídios nas empresas onde a corrida pela eficiência se tornou
simplesmente desumana. O stress profissional
está se tornando uma doença planetária, e a questão da qualidade de vida no
trabalho passa a ocupar um espaço central.
A redistribuição social da carga de trabalho torna-se hoje uma
necessidade. As resistências são compreensíveis, mas a realidade é que com os
avanços da tecnologia os processos produtivos tornam-se cada vez menos
intensivos em mão de obra, e reduzir a jornada é uma questão de tempo. Não
podemos continuar a basear o nosso desenvolvimento em ilhas tecnológicas
ultramodernas enquanto se gera uma massa de excluídos, inclusive porque se
trata de equilibrar a remuneração e, consequentemente, a demanda. A redução da
jornada não reduzirá o bem estar ou a riqueza da população, e sim a deslocará
para novos setores mais centrados no uso do tempo livre, com mais atividades de
cultura e lazer. Não precisamos necessariamente de mais carros e de mais
bonecas Barbie, precisamos sim de mais qualidade de vida.
VI – Não Viverás para o Dinheiro
A mudança de comportamento, de estilo de vida, não constitui um
sacrifício, e sim um resgate do bom senso. Neste planeta de 7 bilhões de
habitantes, com um aumento anual da ordem de 75 milhões, toda política envolve também uma mudança de
comportamento individual e da cultura do consumo. O respeito às normas
ambientais, a moderação do consumo, o cuidado no endividamento, o uso
inteligente dos meios de transporte, a generalização da reciclagem, a redução
do desperdício – há um conjunto de formas de organização do nosso cotidiano que
passa por uma mudança de valores e de atitudes frente aos desafios econômicos,
sociais e ambientais. No apagão energético do final dos anos 90 no Brasil,
constatou-se como uma boa campanha informativa, o papel colaborativo da mídia,
e a punição sistemática dos excessos permitiu uma racionalização generalizada
do uso doméstico da energia. Esta dimensão da solução dos problemas é
essencial, e envolve tanto uma legislação adequada, como sobretudo uma participação
ativa da mídia.
Hoje 95% dos domicílios no Brasil
têm televisão, e o uso informativo inteligente deste e de outros meios de
comunicação tornou-se fundamental. Frente aos esforços necessários para
reequilibrar o planeta, não basta reduzir o martelamento publicitário que apela
para o consumismo desenfreado, é preciso generalizar as dimensões informativas
dos meios de comunicação. A mídia científica praticamente desapareceu, os
noticiários navegam no atrativo da criminalidade, quando precisamos vitalmente
de uma população informada sobre os desafios reais que enfrentamos. A pergunta
a se fazer a cada ato de conusmo, não é só se “é bom para mim”, mas se é bem
para o planeta e o bem comum, e buscar um equilíbrio razoável. A opção
individual é essencial, mas não suficiente. Grande parte da mudança do
comportamento individual depende de ações públicas: as pessoas não deixarão o
carro em casa (ou deixarão de tê-lo) se não houver transporte público, não
farão reciclagem se não houver sistemas adequados de coleta. Precisamos de uma
política pública de mudança do comportamento individual.
VII –
Não Ganharás Dinheiro com o Dinheiro dos Outros
Racionalizar os sistemas de intermediação
financeira é viável. A alocação final dos recursos financeiros deixou de
ser organizada em função dos usos finais de estímulo e orientação de atividades
econômicas e sociais, para obedecer às finalidades dos próprios intermediários
financeiros. A atividade de crédito é sempre uma atividade pública, seja no
quadro das instituições públicas, seja no quadro dos bancos privados que
trabalham com dinheiro do público, e que para tanto precisam de uma
carta-patente que os autorize a ganhar dinheiro com dinheiro dos outros. A
recente crise financeira de 2008 demonstrou com clareza o caos que gera a
ausência de mecanismos confiáveis de regulação no setor. Nas últimas duas
décadas, temos saltado de bolha em bolha, de crise em crise, sem que a relação
de forças permita a reformulação do sistema de regulação em função da
produtividade sistêmica dos recursos. Enquanto não se gera uma relação de
forças mais favorável, precisamos batalhar os sistemas nacionais de regulação
financeira. O dinheiro não é mais produtivo onde rende mais para o
intermediário: devemos buscar a produtividade sistêmica de um recurso que é
público.
A Coréia do
Sul abriu recentemente um financiamento de 36 bilhões de dólares para financiar
transporte coletivo e alternativas energéticas, gerando com isto 960 mil
empregos. O impacto positivo é ambiental pela redução de emissões, é anti-cíclico
pela dinamização da demanda, é social pela redução do desemprego e pela renda
gerada, é tecnológico pelas inovações que gera nos processos produtivos mais
limpos. Tem inclusive um impacto raramente considerado, que é a redução do
tempo vida que as pessoas desperdiçam no transporte. Trata-se aqui,
evidentemente, de financiamento público, pois os bancos comerciais não teriam
esta preocupação, nem esta visão sistêmica. (UNEP,Global Green New Deal, 2009). Em última instância, os recursos
devem ser tornados mais acessíveis segundo que os objetivos do seu uso sejam
mais produtivos em termos sistêmicos, visando um desenvolvimento mais inclusivo
e mais sustentável. A intermediação financeira é um meio, não é um fim.
Particular
atenção precisa ser dada aos intermediários que ganham apenas nos fluxos entre
outros intermediários – com papéis que representam direitos sobre outros papéis
– e que têm tudo a ganhar com a maximização dos fluxos, pois são remunerados
por comissões sobre o volume e ganhos, e geram portanto volatilidade e
pro-ciclicidade, com os monumentais volumes que nos levaram por exemplo a
valores em derivativos da ordem de 863 trilhões de dólares em junho de 2008, 15
vezes o PIB mundial. A intermediação especulativa – diferentemente das intermediação
de compras e vendas entre produtores e utilizadores finais – apenas gera uma
pirâmide especulativa e insegurança, além de desorganizar os mercados e as
políticas econômicas.[1]
VIII – Não Tributarás Boas Iniciativas
A filosofia do imposto, de quem se cobra, e a quem se aloca, precisa
ser revista. Uma política tributária equilibrada na cobrança, e reorientada
na aplicação dos recursos, constitui um dos instrumentos fundamentais de que
dispomos, sobretudo porque pode ser promovida por mecanismos democráticos. O
eixo central não está na redução dos impostos, e sim na cobrança socialmente
mais justa e na alocação mais produtiva em termos sociais e ambientais. A
taxação das transações especulativas (nacionais ou internacionais) deverá gerar
fundos para financiar uma série de políticas essenciais para o reequilíbrio
social e ambiental. O imposto sobre grandes fortunas é hoje essencial para
reduzir o poder político das dinastias econômicas (10% das famílias do planeta
é dono de 90% do patrimônio familiar acumulado no planeta). O imposto sobre a
herança é fundamental para dar chances a partilhas mais equilibradas para as
sucessivas gerações. O imposto sobre a renda deve adquirir mais peso
relativamente aos impostos indiretos, com alíquotas que permitam efetivamente
redistribuir a renda. É importante lembrar que as grandes fortunas do planeta
em geral estão vinculadas não a um acréscimo de capacidades produtivas do
planeta, e sim à aquisição maior de empresas por um só grupo, gerando uma
pirâmide cada vez mais instável e menos governável de propriedades cruzadas,
impérios onde a grande luta é pelo controle do poder financeiro, político e
midiático, e a apropriação de recursos naturais. O sistema tributário tem de
ser reformulado no sentido anti-cíclico, privilegiando atividades produtivas e
penalizando as especulativas; no sentido do maior equilíbrio social ao ser
fortemente progressivo; e no sentido de proteção ambiental ao taxar emissões
tóxicas ou geradoras de mudança climática, bem como o uso de recursos naturais
não renováveis.[2]
O poder redistributivo do Estado
é grande, tanto pelas políticas que executa – por exemplo as políticas de
saúde, lazer, saneamento e outras infra-estruturas sociais que melhoram o nível
de consumo coletivo – como pelas que
pode fomentar, como opções energéticas, inclusão digital e assim por diante.
Fundamental também é a política redistributiva que envolve política salarial,
de previdência, de crédito, de preços, de emprego. A forte presença das
corporações junto ao poder político constitui um dos entraves principais ao
equilíbrio na alocação de recursos. O essencial é assegurar que todas as
propostas de alocação de recursos sejam analisadas pelo triplo enfoque
econômico, social e ambiental. No caso brasileiro, constatou-se com as recentes
políticas sociais (“Bolsa-Família”, políticas de previdência etc.) que volumes
relativamente limitados de recursos, quando chegam à “base da pirâmide”, são
incomparavelmente mais produtivos, tanto em termos de redução de situações
críticas e consequente aumento de qualidade de vida, como pela dinamização de
atividades econômicas induzidas pela demanda local. A democratização aqui é
fundamental. A apropriação dos mecanismos decisórios sobre a alocação de
recursos públicos está no centro dos processos de corrupção, envolvendo as
grandes bancadas corporativas, por sua vez ancoradas no financiamento privado
das campanhas.
IX – Não Privarás o Próximo do Direito
ao Conhecimento
Travar o acesso ao conhecimento e às
tecnologias sustentáveis não faz o mínimo sentido. A participação efetiva
das populações nos processos de desenvolvimento sustentável envolve um denso
sistema de acesso público e gratuito à informação necessária. A conectividade
planetária que as novas tecnologias permitem constitui uma ampla via de acesso
direto. O custo-benefício da inclusão digital generalizada é simplesmente
imbatível, pois é um programa que desonera as instâncias administrativas
superiores, na medida em que as comunidades com acesso à informação se tornam
sujeitos do seu próprio desenvolvimento. A rapidez da apropriação deste tipo de
tecnologia até nas regiões mais pobres se constata na propagação do celular,
das lan houses mais modestas. O impacto produtivo é imenso para os pequenos
produtores que passam a ter acesso direto a diversos mercados tanto de insumos
como de venda, escapando aos diversos sistemas de atravessadores comerciais e
financeiros. A inclusão digital generalizada é um destravador potente do
conjunto do processo de mudança que hoje se torna indispensável.
O mundo frequentemente esquece
que 2 bilhões de pessoas ainda cozinham com lenha, área em que há inovações
significativas no aproveitamento calórico por meio de fogões melhorados.
Tecnologias como o sistema de cisternas do Nordeste, de aproveitamento da biomassa,
de sistemas menos agressivos de proteção dos cultivos etc., constituem um vetor
de mudança da cultura dos processos produtivos. A criação de redes de núcleos
de fomento tecnológico online, com ampla capilaridade, pode se inspirar da
experiência da Índia, onde foram criados núcleos em praticamente todas as vilas
do país. O World Economic and Social
Survey 2009 é particularmente eloquente ao defender a flexibilização de
patentes no sentido de assegurar ao conjunto da população mundial o acesso às
informações indispensáveis para as mudanças tecnológicas exigidas por um
desenvolvimento sustentável.
X – Não Controlarás a Palavra do Próximo
Democratizar a comunicação tornou-se
essencial. A comunicação é uma das áreas que mais explodiu em termos de
peso relativo nas transformações da sociedade. Estamos em permanência cercados
de mensagens. As nossas crianças passam horas submetidas à publicidade
ostensiva ou disfarçada. A indústria da comunicação, com sua fantástica
concentração internacional e nacional -
e a sua crescente interação entre os dois níveis - gerou uma máquina de
fabricar estilos de vida, um consumismo obsessivo que reforça o elitismo, as
desigualdades, o desperdício de recursos como símbolo de sucesso. O sistema
circular permite que os custos sejam embutidos nos preços dos produtos que nos
incitam a comprar, e ficamos envoltos em um cacarejo permanente de mensagens
idiotas pagas do nosso bolso. Mais recentemente, a corporação utiliza este
caminho para falar bem de si, para se apresentar como sustentável e, de forma
mais ampla, como boa pessoa. O espectro eletromagnético em que estas mensagens
navegam é público, e o acesso a uma informação inteligente e gratuita para todo
o planeta, é simplesmente viável. Expandindo gradualmente as inúmeras formas
alternativas de mídia que surgem por toda parte, há como introduzir uma cultura
nova, outras visões de mundo, cultura diversificada e não pasteurizada,
pluralismo em vez de fundamentalismos religiosos ou comerciais.
O fato que mais inspira esperança
é a multiplicação impressionante de iniciativas nos planos da tecnologia, dos
sistemas de gestão local, do uso da internet para democratizar o conhecimento,
da descoberta de novas formas de produção menos agressivas, de formas mais
equilibradas de acesso aos recursos. O Brasil neste plano tem mostrado que
começar a construir uma vida mais digna para o “andar de baixo”, para os dois
terços de excluídos, não gera tragédias para os ricos. Inclusive, numa
sociedade mais equilibrada, todos passarão a viver melhor. Tolerar um mundo
onde um bilhão de pessoas passam fome, onde 10 milhões de crianças morrem
anualmente de causas ridículas, e onde se dilapidam os recursos naturais das
próximas gerações, em proveito de fortunas irresponsáveis, já não é possível.
Nesta época interativa, o
Altíssimo declarou-se disposto a considerar outros Mandamentos. Sendo o
Secretariado do Altíssimo hoje bem equipado, os que por acaso tenham sugestões
ou necessitem consultar documentos mais completos, poderão se instruir com
outros Assessores, em linha direta sob www.criseoportunidade.wordpress.com
Críticas, naturalmente, deverão ser
endereçadas a Instâncias Superiores. Apreciações positivas e sugestões de
outros Mandamentos poderão ser enviadas ao blog acima citado, ou no e-mail ladislau@dowbor.org
[1] BIS Quarterly Review, December 2008, Naohiko Baba et al., www.bis.org/publ/qtrpdf/r_qt0812b.pdf
p. 26: “In November, the BIS released the
latest statistics based on positions as at end-june 2008 in the global
over-the-counter (OTC) derivatives markets. The notional amounts outstanding of
OTC derivatives continued to expand in the first half of 2008. Notional amounts
of all types of OTC contracts stood at $863 trillion at the end of June, 21%
higher than six months before”. São
863 trilhões de dólares de derivativos emitidos, frente a um PÌB mundial de
cerca de 60 trilhões.
[2] Susan George traz uma ilustração convincente: um bilionário que aplica o
seu dinheiro com uma conservadora remuneração de 5% ao ano, aumenta a sua
fortuna em 137 mil dólares por dia. Taxar este tipo de ganhos não é “aumentar
os impostos”, é corrigir absurdos.
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