Não sei se uma triste homenagem a Chico ou um simples reconhecimento de sua
genialidade. O fato é que hoje, como ontem, a letra de uma de suas melhores e
significativas músicas, “Roda Viva”, que tão bem representou o sentimento de
angústia nos períodos de chumbo, durante a ditadura no Brasil, venha hoje,
representar outra angústia, outra dor, neste curto período de aprendizado
democrático.
O fato é que hoje estamos
pagando por erros de um passado recentíssimo, quando um partido como o PT,
nascido de um belo parto natural, sem fórceps, abre mão de seus ideais e nada
contra a corrente do rio que desaguou em sua criação.
Parto da história do PT no
Estado do Rio e seus municípios, mas que foi comum em vários outros estados
deste país. Ainda no ano de 94, Milton Temer e Vladimir Palmeira disputam a
prévia para o governo. Vladimir vence, mas Bitar foi o candidato após a
corrente majoritária provocar o não quórum na disputa inicial, manobrando assim
a busca do que acreditavam ser o melhor. Nosso candidato chegou em 4º lugar
atrás do Cel. Newton Cruz.
Chegam as eleições de 96
(municipais), Chico Alencar disparado na disputa interna do partido no Rio.
Lula, nosso grande presidente (sem ironia), pede a Chico que abandone a
campanha e apoie Miro Teixeira. A militância do PT nas ruas – eu, Quaquá e
muitos, em campanha em Maricá, fomos para o Rio fazer a campanha de Chico
algumas vezes, e o PT “sabotava” a campanha. Sem dinheiro, Chico ficou há 90
mil votos do segundo turno. Conde ganhou e Miro ficou em 5º lugar.
No ano de 98 foi o clímax.
Nem Brizola queria o Garotinho, como havia colocado para Chico, Milton Temer e
o falecido Neiva. Novamente a militância conquista a Convenção e lança
oficialmente Vladimir Palmeira para governador. O resultado ninguém esquece, estava
em São Paulo e ouvi/cantei Zé Ramalho e Beth Carvalho (“E ver que toda essa,
engrenagem / Já sente o ferrugem lhe comer” e “Você pagou com traição a quem
sempre lhe deu a mão”). A candidatura conquistada no voto estava caçada em
favor de Garotinho, que em seguida lançou-se candidato a presidente do Brasil,
contra o PT. Chega-nos a roda viva.
"Tem
dias que a gente se sente / Como quem partiu ou morreu / A gente estancou de
repente / Ou foi o mundo então que cresceu / A gente quer ter voz ativa / No nosso
destino mandar / Mas eis que chega a roda-viva / E carrega o destino pra
lá."
Abrimos mão de nossos
destinos em nome de um pragmatismo que talvez não fosse tão necessário assim.
Oito anos depois de muita desgraceira, conquistamos Brasília. De lá para cá,
são exatos 14 anos onde, não tem como negar que houve transformação na vida
daqueles mais carentes. Uma transformação para melhor, com mais dignidade. Mas
a que preço?
Abandonamos nossas crenças
e nossos princípios, pior e mais graves, nossa democracia interna. Deixamos de
discutir internamente e com a população, quando abrimos mãos de sua organização
que tantos frutos nos renderam. Hoje somos um partido verticalizado, mesmo no
melhor de suas administrações, o diálogo é reduzido ou não existe. A nossa mais
linda roseira, que se chamava democracia interna, é levada para lá.
"A
gente vai contra a corrente / Até não poder resistir / Na volta do barco é que
sente / O quanto deixou de cumprir / Faz tempo que a gente cultiva / A mais
linda roseira que há / Mas eis que chega a roda-viva / E carrega a roseira pra
lá."
A consequência de vir a
fazer parte da mesmice do cotidiano político do Brasil, um cotidiano triste,
não honesto com sua população, nos levou a descrença enquanto um partido de
ideário firme e ético, junto a essa mesma população. Somos mais um partido,
igual a todos os demais. Não soubemos nos comportar enquanto intrusos que somos
nas engrenagens do poder. Engrenagens criadas pelos donos do poder, de acordo
com as Leis criadas por eles e para atender as necessidades deles. Uma vez
entre seus dentes rotatórios, não colocamos nenhuma cunha, não tentamos
modificá-las. Iludimo-nos achando que nos serviriam e acabamos por servi-la,
conquistados que fomos por suas benesses.
"A
roda da saia, a mulata / Não quer mais rodar, não senhor / Não posso fazer
serenata / A roda de samba acabou / A gente toma a iniciativa / Viola na rua, a
cantar / Mas eis que chega a roda-viva / E carrega a viola pra lá."
O trabalho agora é resgatar
nossa viola, para na rua voltarmos a cantar. O problema é como? Bastará-nos
retornar ao passado? Claro que não, não temos tempo para começarmos agora a
formar corações e mentes, atividade abandonada há muito e que precisa ser
resgatada. Manter ou buscar novos acordos com aqueles que sempre nos quiseram
pelas costas, se não mortos? Claro que não, seria um simples paliativo para uma
“morte já anunciada”, lembrando Garcia Marquez. O problema está no “se ficar o
bicho pega, se correr o bicho come”, situação que é de inteira responsabilidade
nossa.
Podemos compor e
continuarmos a sermos massacrados na mídia e no Congresso, em fogo brando ou
morno, de acordo com as nossas concessões e perdas de conquistas. Ou ir para o
enfrentamento, deixarmos de ser dentes na engrenagem, e não permitir que a
fogueira queime nossa utopia para que transformemos nossos sonhos em verdades.
"O
samba, a viola, a roseira / Um dia a fogueira queimou / Foi tudo ilusão
passageira / Que a brisa primeira levou / No peito a saudade cativa / Faz força
pro tempo parar / Mas eis que chega a roda-viva / E carrega a saudade pra
lá."
O problema é que o tempo
não para, e ele pode ser cruel ou benévolo, a escolha é nossa.
Te abraço,
Te abraço,
Sérgio
Mesquita
Secretário de Formação do PT-Maricá
Secretário de Formação do PT-Maricá