É sempre bom relembrar o belo.
Fugindo um pouco do cotidiano do Golpe, agora
possivelmente, como compararam ao futebol, na fase do mata-mata (modelo
mineira, policial mineiro, Teori), mas sem sair do foco, segue abaixo o
discurso do Evo Morales, feito em 2013 para nossos “amigos da onça” europeus.
O discurso além de brilhante, e tratar dos 500
anos de nossa história comum, deixa bem claro que, do Descobrimento de nossas
terras ao Sul até os dias de hoje, nada mudou. Evo, como coloca Leonardo Boff,
que disponibilizou em seu blog o discurso, calou a plateia de líderes e autoridades
europeia.
Diálogos do Sul •
Publicado em: 26/07/2013.
“Aqui eu, Evo Morales,
vim encontrar aqueles que participam da reunião.
Aqui eu, descendente dos
que povoaram a América há quarenta mil anos, vim encontrar os que a encontraram
há somente quinhentos anos.
Aqui pois, nos
encontramos todos. Sabemos o que somos, e é o bastante. Nunca pretendemos outra
coisa.
O irmão aduaneiro europeu
me pede papel escrito com visto para poder descobrir aos que me descobriram. O
irmão usurário europeu me pede o pagamento de uma dívida contraída por Judas, a
quem nunca autorizei a vender-me.
O irmão rábula europeu me
explica que toda dívida se paga com bens ainda que seja vendendo seres humanos
e países inteiros sem pedir-lhes consentimento. Eu os vou descobrindo. Também
posso reclamar pagamentos e
também posso reclamar juros. Consta no Archivo de Indias, papel sobre papel,
recibo sobre recibo e assinatura sobre assinatura, que somente entre os anos
1503 e 1660 chegaram a San Lucas de Barrameda 185 mil quilos de ouro e 16
milhões de quilos de prata provenientes da América.
Saque?
Não acredito! Porque seria pensar que os irmãos cristãos pecaram em seu Sétimo
Mandamento.
Expoliação? Guarde-me
Tanatzin (a Mãe Terra) de que os europeus, como Caim, matam e negam o sangue de
seu irmão!
Genocídio? Isso seria dar
crédito aos caluniadores, como Bartolomé de las Casas, que qualificam o
encontro como de destruição das Índias, ou a radicais como Arturo Uslar Pietri,
que afirma que o avanço do capitalismo e da atual civilização europeia se deve
à inundação de metais preciosos!
Não! Esses 185 mil quilos
de ouro e 16 milhões de quilos de prata devem ser considerados como o primeiro
de muitos outros empréstimos amigáveis da América, destinado ao desenvolvimento
da Europa. O contrário seria presumir a existência de crimes de guerra, o que
daria direito não só de exigir a devolução imediata, mas também a indenização
pelas destruições e prejuízos. Não
Eu, Evo Morales, prefiro
pensar na menos ofensiva destas hipóteses.
Tão fabulosa exportação
de capitais não foram mais que o início de um plano ‘MARSHALLTESUMA’, para
garantir a reconstrução da bárbara Europa, arruinada por suas deploráveis
guerras contra os cultos muçulmanos, criadores da álgebra, da poligamia, do
banho cotidiano e outras conquistas da civilização.
Por isso, ao celebrar o
Quinto Centenário do Empréstimo, poderemos perguntar-nos: Os irmãos europeus
fizeram uso racional, responsável ou pelo menos produtivo dos fundos tão
generosamente adiantados pelo Fundo Indoamericano Internacional? Lastimamos
dizer que não. Estrategicamente, o dilapidaram nas batalhas de Lepanto, em
armadas invencíveis, em terceiros reichs e outras formas de extermínio mútuo,
sem outro destino que terminar ocupados pelas tropas gringas da OTAN, como no
Panamá, mas sem canal. Financeiramente, tem sido incapazes, depois de uma
moratória de 500 anos, tanto de cancelar o capital e seus fundos, quanto de tornarem-se
independentes das rendas líquidas, das matérias primas e da energia barata que
lhes exporta e provê todo o Terceiro Mundo.
Este deplorável quadro
corrobora a afirmação de Milton Friedman segundo a qual uma economia subsidiada
jamais pode funcionar e nos obriga a reclamar-lhes, para seu próprio bem, o
pagamento do capital e os juros que, tão generosamente temos demorado todos
estes séculos em cobrar. Ao dizer isto, esclarecemos que não nos rebaixaremos a
cobrar de nossos irmãos europeus as vis e sanguinárias taxas de 20 e até 30 por
cento de juros, que os irmãos europeus cobram dos povos do Terceiro Mundo. Nos
limitaremos a exigir a devolução dos metais preciosos adiantados, mais o módico
juros fixo de 10 por cento, acumulado somente durante os últimos 300 anos, com
200 anos de graça.
Sobre esta base, e
aplicando a fórmula europeia de juros compostos, informamos aos descobridores
que nos devem, como primeiro pagamento de sua dívida, uma massa de 185 mil
quilos de ouro e 16 milhões de quilos de prata, ambos valores elevados à
potência de 300. Isto é, um número para cuja expressão total, seriam
necessários mais de 300 algarismos, e que supera amplamente o peso total do
planeta Terra.
Muito pesados são esses
blocos de ouro e prata. Quanto pesariam, calculados em sangue?
Alegar que a Europa, em
meio milênio, não pode gerar riquezas suficientes para cancelar esse módico
juro, seria tanto como admitir seu absoluto fracasso financeiro e/ou a
demencial irracionalidade das bases do capitalismo.
Tais questões metafísicas,
desde logo, não inquietam os indoamericanos. Mas exigimos sim a assinatura de
uma Carta de Intenção que discipline os povos devedores do Velho Continente, e
que os obrigue a cumprir seus compromissos mediante uma privatização ou
reconversão da Europa, que permita que a nos entregue inteira, como primeiro
pagamento da dívida histórica.”